MOMENTO BRASILEIRO

 

Artigo escrito em 24.10.2001 para o Momento.

Prof. Marcos Coimbra

Professor Titular de Economia na Universidade Candido Mendes, Professor na UERJ e Conselheiro da ESG

                   Vamos analisar a atual conjuntura brasileira, em especial a  econômica, com base nos indicadores econômicos, sociais e políticos fornecidos em sua maior parte pelos próprios órgãos da administração FHC. Recordemos alguns deles. O déficit nominal alcança mais de 6 % do Produto Interno Bruto (PIB). O déficit do Balanço de Pagamentos em Transações Correntes ficará em torno de US$ 25 bilhões. O desemprego atinge mais de doze milhões de brasileiros. O PIB permanece estagnado.  A dívida externa chega a US$ 210 bilhões, depois da "maquilagem" feita e a dívida interna ultrapassa R$ 640 bilhões. O país pagou nos últimos doze meses em torno de R$ 140 bilhões de juros da dívida interna. Só de amortizações da dívida externa o Brasil terá de pagar US$ 30 bilhões no decorrer do corrente ano. E, em 2002, segundo o Banco Central (BACEN), as necessidades para fechar nossas contas externas serão de US$ 50 bilhões, enquanto que empresas de consultoria estrangeira estimam as mesmas  necessidades em US$ 80 bilhões. A taxa de juros SELIC permanece nos indecentes 19%. O sistema financeiro obteve, no primeiro semestre, no Brasil, lucros fantásticos, praticamente sem pagar imposto de renda. A inadimplência aumenta a cada mês. A inflação oficial ultrapassa a meta fixada com o Fundo Monetário Internacional (FMI). A Argentina prossegue em sua agonia, atingindo o pior resultado, em sua história econômica, no tocante à classificação de risco para investidores estrangeiros. Nosso modelo econômico, excessivamente dependente, expõe sua vulnerabilidade por inteiro, obtendo resultados parecidos. 

                   A nível qualitativo, diagnostica-se a carência brutal em termos de geração de empregos de qualidade, de erradicação da pobreza absoluta, de atenuação dos desequilíbrios regionais e  outros. Na expressão psicossocial, pauperiza-se a classe média, em processo de desaparecimento. A  saúde pública  apresenta resultados alarmantes, caracterizando um verdadeiro genocídio. A administração FHC só investe nela cerca de R$ 20 bilhões por ano. O  processo educacional público não forma nada, nem ninguém, e o investimento nele não ultrapassa o limite de R$ 10 bilhões anuais. A greve dos docentes persiste. Até vestibulares são adiados pela Justiça. A insegurança aumenta. Só agora as autoridades descobrem a necessidade de haver um SINAMOB (Sistema Nacional de Mobilização) funcionando. O atual ministro da Justiça é premiado com o cargo de embaixador em Portugal, por sua amizade à família presidencial. E o indicado traz em suas folha corrida diversos assaltos, dentre eles o do trem da Estrada de Ferro Santos-Jundiaí e o do carro de valores  da Massey Ferguson.  A reforma da previdência devolve o trabalhador ao tempo da escravatura. Existem funcionários públicos que estão há sete anos sem reajuste salarial, tendo seu poder de compra reduzido para 74%. A corrupção atinge níveis alarmantes. O exemplo do Senado, da Câmara de Deputados, do Estado do Espírito Santo, do município de São Paulo e outros  não deixam dúvidas sobre o que está ocorrendo no país.

Na expressão política, o sistema financeiro internacional continua a eleger e derrubar presidentes e outros menos votados. O Congresso demonstra, com os últimos episódios, o grau de corrupção acentuada e sua tibieza. Deputados mudam de partido em troca de benesses diretas e indiretas. Os eleitos são perfeitos representantes do nosso Legislativo. O Estado Nacional Soberano é paulatinamente destruído. O acordo de Alcântara, com parecer contrário do relator da Comissão de Defesa do Estado e de Relações  Exteriores, e diante da possibilidade de rejeição pela citada Comissão, por manobra do presidente da Câmara de Deputados, foi colocado em compasso de espera, mas, em paralelo, encaminhado à Comissão de Ciência e Tecnologia, onde poderia ser aceito, contrariando a vontade nacional e caracterizando mais um crime de lesa pátria. Diante do clamor nacional, volta à Comissão original, com votação prevista para dia 24 de outubro.

Já se volta a falar no Brasil na hipótese de implantar o parlamentarismo, já rejeitado duas vezes pelo povo, em votações expressivas. A aprovação da reeleição representou um " golpe branco". A ação empreendida pelo sistema financeiro internacional dominando os meios de comunicação de massa, o controle do Legislativo e do Judiciário (em fase de conclusão) pelo Executivo e a cumplicidade da oposição, em parte já cooptada, pode provocar a continuidade, com a vitória da "oposição" de francaria.  Com mais quatro anos de mandato condicionado à vontade externa, depois de oito anos de entreguismo, pouco sobrará do Brasil que recebemos de nossos antepassados. Talvez nem a Amazônia. Falta à elite a visão estratégica, de longo prazo.

 

                   As Forças Armadas são imobilizadas e assistem impotentes à derrocada da Soberania Nacional. O ministro da Defesa do Brasil, Sr. Geraldo Quintão, realizou uma significativa visita ao secretário de Defesa dos EUA, Sr. William Cohen. A assessoria do Sr. Quintão informou: "Nunca  na história Brasil e Estados Unidos tiveram relações tão densas em vários campos de entendimento, reforçadas pela facilidade de diálogo entre os presidentes Bill Clinton e Fernando Henrique Cardoso. É natural, portanto, que o estreitamento seja também estendido ao campo da defesa". No dia 02 de junho de 2000, a administração brasileira acabou aceitando a assinatura  do Protocolo 505, um acordo pelo qual os EUA se comprometem a doar-nos  material bélico sucateado, tendo como contrapartida a abertura de nossos quartéis para inspeções regulares (por solicitação de militares nacionalistas, conseguiu-se o favor de que as inspeções sejam feitas em datas pré-agendadas com as Forças Singulares brasileiras). Revive o famigerado Acordo Militar Brasil-EUA.

                   Representa o retorno à situação anterior vivenciada pelo Brasil, antes do Governo Geisel, quando este promoveu o rompimento do então vigente acordo militar Brasil-EUA. Além disto, logo depois da visita, em passado recente, do mesmo Sr. Cohen ao país, foi criado o ministério da Defesa no país, comandado ainda por um civil, por imposição dos EUA, com a extinção do EMFA e dos ministérios militares, reduzidos agora a Comandos. Também foi implementada  a Secretaria Nacional Antidrogas (SENAD), diretamente subordinada à Presidência da República, pois os americanos exigem a intervenção direta do presidente da República, no relativo ao combate às drogas, bem como a campanha de desarmamento radical da população digna e de bons costumes.

                   Outros 86 países já são signatários do Protocolo 505, sendo o Brasil a 87ª nação. Falta ainda a aprovação do Congresso, porém como o atual Legislativo está sob controle total do Executivo, não é difícil prever que será aprovado. É óbvio que se cria assim um incentivo à indústria bélica dos EUA, pois o material doado será reparado, de tempos em tempos, criando assim um mercado cativo para os irmãos do Norte. Ainda fazem parte da pauta de reuniões, além de operações de paz, o combate a crimes transnacionais e cibernéticos e a formação de quadros civis para compor a estrutura militar brasileira. Agora entendemos melhor as razões da campanha pela anulação da Escola Superior de Guerra (ESG). Os futuros quadros civis brasileiros deverão ser formados sob orientação do "National Defense University".

                   O percentual de gastos com defesa em relação ao PIB  cai para 1,6%, sendo que 1,2% para atender a despesas de pessoal. Sobra apenas 0,4% para cobrir custos de adestramento e aprestamento. E a mídia amestrada silencia. Denunciavam que, na época do regime dito militar, o Brasil era colônia dos EUA. Agora, quando os neoesquerdistas estão no poder, nunca houve uma  influência tão impositiva dos EUA sobre o Brasil como  no momento. Acabaram até com a indústria bélica nacional. A ENGESA, a IMBEL a AVIBRÀS que chegaram a concorrer e ganhar, em concorrências internacionais, dos mais tradicionais fornecedores de armamentos foram imobilizadas. A EMBRAER, em parte, já pertence ao grupo DASSAULT.

                   A economia brasileira não suportará muito tempo sem promover os ajustes necessários , como, por exemplo, a diminuição da taxa de juros, a reforma fiscal capaz de diminuir as alíquotas, minimizando a sonegação e aumentando a arrecadação e o controle do saldo do Balanço de Pagamentos em Transações Correntes (imposição de tarifas alfandegárias protecionistas e redução dos tributos que oneram as exportações).  As correções terão que ser feitas mais cedo ou mais tarde. O volume de reservas cambiais, cerca de US$ 40  bilhões em seu conceito líquido, não possui qualidade capaz de propiciar-nos segurança, pois diminuirá para US$ 20 bilhões, em pouco tempo. Estamos dependentes das variações experimentadas pelas economias das nações centrais, em especial da norte-americana. Tudo passa a ser função da taxa de juros arbitrada pelo FED ou da  crise que atinge  a Bolsa de Valores dos EUA ou da esperada  crise financeira mundial, agravada pelo atentado terrorista de 11 de setembro e pela retaliação prevista dos EUA.

                   Este é o triste diagnóstico do atual momento brasileiro. E as perspectivas não são animadoras. Os principais candidatos apresentados à presidência da República representam a continuidade do modelo de dependência. Haverá um candidato ostensivo do sistema (Serra, Tasso, Alckmin), um fingindo ser de oposição (Ciro), outro também ligado ao sistema (Garotinho) e um potencial De La Rúa (Lula). A pré-candidata Roseana não deverá emplacar. Seus índices de intenção de votos não refletem a realidade. Sobram o governador Itamar e o Dr. Enéas, como sempre perseguidos pela mídia amestrada, que procura desqualifica-los.

                   Na prática, torna-se evidente a imperiosa necessidade de que, na ocasião de eleição, todos os postulantes à presidência da República apresentem seus respectivos planos, com transparência, para que o eleitorado não seja mais uma vez enganado, como nas últimas campanhas, quando, em momento algum, o atual presidente revelou sua intenção em "entregar" as riquezas do país, a começar pela "doação" da Vale do Rio Doce.

Apresentamos, a seguir, como sugestão, uma síntese de variáveis-metas e respectivas variáveis-instrumentais passíveis de serem adotadas:

A - Buscar o pleno emprego dos fatores de produção. A1 - incrementar as atividades do "agronegócio" e do setor terciário, investindo maciçamente em ciência e tecnologia, educação básica e profissionalizante e acoplar o setor secundário ao setor primário, para agregar mais valor aos bens produzidos; A2 - procurar uma industrialização mais avançada, fortalecendo o mercado interno, empregando tecnologia industrial avançada e perseguindo autonomia energética nacional, assegurando a inclusão independente do país no comércio exterior , via adoção de tecnologia de ponta e exportação de manufaturados, com atendimento pela produção interna da demanda interna; A3 - gerar mais empregos, utilizando o BNDES como principal agente da política planejada; A4 - diminuir a taxa de juros.

B - Recuperar a capacidade nacional de investimento, aumentando a formação bruta de capital fixo em 10%, de modo a fazer o PIB crescer em 7% ao ano. B1 - aplicar política fiscal, de modo a aumentar a arrecadação, com diminuição das alíquotas tributárias, de forma a aumentar o universo tributário, diminuindo os gastos com serviços da dívida; B2 - empregar as reservas financeiras das empresas (4% do PIB); B3 - tornar o setor público superavitário em 6% do PIB; B4 - pugnar pelo reingresso dos recursos adicionais emigrados para o exterior.

C - Garantir a inserção soberana do Brasil na economia internacional, por intermédio de adoção de políticas cambial, de comércio exterior e de administração da dívida externa adequadas. C1 - assegurar a expressividade da taxa de câmbio e supervisionar administrativamente o orçamento cambial; C2 - fixar o nível de proteção aduaneira à produção  interna e a renegociar a dívida externa; C3 - romper o acordo com o FMI.

D - Proceder a uma reforma tributária, capaz de :

D1 - garantir a participação justa de todos os entes federativos na repartição; D2 - procurar o equilíbrio federativo,

                   É preciso lutar para resgatar a parcela perdida do Brasil e impedir sua perda total!

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