PERDAS INTERNACIONAIS
Artigo publicado em 17.01.2002 no Monitor Mercantil.
Prof. Marcos Coimbra
Professor Titular de Economia junto à Universidade Candido Mendes, Professor na UERJ e Conselheiro da ESG
Durante muito tempo, o ex-governador Leonel de Moura Brizola afirmou, e ainda afirma, que a principal causa das agruras experimentadas pelos países periféricos reside nas chamadas perdas internacionais. Alguns autores procuraram desqualificar tal argumentação, a maioria da população não entendeu e poucos compreenderam o real significado das citadas perdas internacionais. Vamos procurar aqui decodificar o que, de fato, não é tão fácil de perceber, considerando os não iniciados.
De início, é importante identificar as nações centrais : EUA, Japão e Alemanha. Elas possuem corporações poderosas que constituem a denominada tri-lateral, dominado a economia mundial. Existem nações intermediárias, considerando-se a expressão econômica, como a Grã-Bretanha, a França, a Itália e outras poucas. As demais compõem as economias periféricas, como o Brasil. No passado, havia nações detentoras de parcos recursos naturais, porém com capital, tecnologia e iniciativa abundantes e dotadas de mão-de-obra altamente qualificada, como Inglaterra, Espanha, Portugal, Holanda. Como precisavam do fator de produção escasso, os recursos naturais, dedicaram-se a procurar no mundo países extratores de matérias-primas, como México, Peru, Brasil e outros. Era época das grandes navegações. Simplesmente ocupavam militarmente estas regiões ricas e tomavam os recursos desejados. O custo era o do transporte e o da manutenção das tropas militares necessárias para manter as colônias.
Com o decorrer do tempo, as colônias foram obtendo a independência política e até mesmo a econômica como os EUA. A maioria, contudo, só obteve a autonomia política. E os laços de dependência econômica, tecnológica, psicossocial e militar foram se sofisticando. Assim, continua a haver o processo de transferência de riquezas das nações periféricas para as nações, mas de forma mais sutil.
Primeiro, é realizado através do índice de relação de trocas do comércio exterior. As mercadorias vendidas pelos países periféricos aos países mais ricos tornam-se cada vez mais baratas, enquanto os bens comprados ficam cada vez mais caros. Desta forma, começa o processo de drenagem de recursos nas nações mais pobres para as nações mais desenvolvidas (superfaturamento das importações e subfaturamento das exportações, nas transações realizadas pelas filiais de empresas multinacioanais) . A seguir, por intermédio de ações psicossociais "vendem" as idéias do seu interesse para as elites dirigentes das nações periféricas, como, por exemplo, as da globalização e do neoliberalismo. Desta forma, emprestam capitais, a taxas extorsivas, fortalecendo os laços de dependência. Prosseguindo, passam a receber, então, juros elevados e crescentes a cada ano. Convencem as elites dirigentes dos países pobres das vantagens da" privatização", trocando "papel pintado" (moeda) por empresas estratégicas e lucrativas, como a Vale do Rio Doce, por exemplo. Em seguida, oferecem o aporte de capitais de risco, aparentemente mais vantajosos, porém ocasionando, cada vez mais, a remessa de lucros e dividendos. Não satisfeitos, dominam a tecnologia de ponta, obtida através de vultosos investimentos em pesquisa, em especial, na pura, fornecendo a tecnologia já ultrapassada, a preços elevados. As nações mais pobres pagam cada vez mais "royalties". A seguir, vão asfixiando a indústria naval tupiniquim, forçando os periféricos a pagar mais por fretes e afretamentos.
Deste modo, vão subtraindo fluxos anuais de renda, no valor de US$ 25 bilhões, por exemplo, no caso brasileiro. A conseqüência é a formação de estoques de dívidas incomensuráveis. No caso brasileiro, US$ 230 bilhões de dívida externa (e uma dívida interna de cerca de R$ 630 bilhões). São centenas de bilhões de dólares de fluxos anuais e trilhões de dólares de estoque de dívidas como decorrência. Isto explica a riqueza dos países mais desenvolvidos e a pobreza das nações periféricas. E a tendência é a perpetuação deste processo. As nações que se conformarem com tal situação correm o risco de sofrer convulsões sociais, como a Argentina. As que se insurgirem correm o risco de serem destroçadas, caso não possuam elementos de dissuasão nuclear, como, por exemplo, o Iraque. É o emprego da expressão militar.
Afinal, este é o processo das chamadas perdas internacionais, incapaz de manter-se por longo tempo, sem que ocorram banhos de sangue.
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