O INÍCIO DO FIM

Publicado em 28.02.2002 no jornal Vila em Foco

Prof. Marcos Coimbra

Professor Titular de Economia junto à Universidade Candido Mendes e Conselheiro da ESG

              A triste situação vivenciada pelos nossos irmãos argentinos mostrou  a que limites a submissão aos "donos do mundo" pode levar. Afinal, os detentores do poder político na Argentina, desde 1989, quando o ex-presidente Carlos Menem assumiu o mandato e, em especial,  ao chamar o representante do sistema financeiro internacional, Sr. Domingo Cavallo, para comandar a economia do país, nada mais fizeram do que seguir rigidamente as diretrizes impostas pelo FMI. Venderam todo o patrimônio nacional, com exceção do Banco de la Nacion e a dívida só cresceu. E a pobreza aumentou. A taxa de desemprego atingiu 20% da população economicamente ativa. Os pobres já ultrapassam a casa de dez milhões de argentinos. O caos levou o povo argentino a derrubar dois governos, no intervalo de dez dias. A classe média percebeu que estava sendo lançada num abismo sem saída. E reagiu violentamente, capitaneando o processo de reação. Dezenas de mortos, centenas de feridos e de prisioneiros foi o lamentável saldo da traição praticada pelos títeres dos "donos do mundo.

              E, é oportuno lembrar, os indicadores sócio-econômicos  argentinos são bem superiores aos do Brasil (renda per capta superior ao dobro; índice de 70% de acesso a remédios básicos contra apenas 40% no Brasil; tempo em média de estudo de 8,8 anos contra menos  de 5 anos em nosso país; índice de desenvolvimento humano da ONU em 34o lugar, enquanto o Brasil de FHC alcançou o 69o lugar).

              Na ocasião  em que a oposição formal parece despertar e descobre a dura realidade consubstanciada na entrega do patrimônio nacional aos estrangeiros e o sórdido processo de privatização empreendido no Brasil, começando a reagir com a iniciativa da entrega de um abaixo-assinado a ser assinado por cinco milhões de pessoas, pedindo a abertura da CPI da Telebrás e o início do processo de impedimento do atual presidente FHC, é necessário recordar alguns fatos. De imediato, a mídia amestrada classifica a ação pretendida como "golpismo", alegando que o presidente foi eleito em pleito democrático, não se admitindo mudança nas regras do jogo no seu  transcurso. Cabe uma simples pergunta. E com o  ex-presidente Collor não foi assim que funcionou? O precedente foi aberto. E ele foi derrubado por muito menos.

              Foi o próprio presidente FHC que deflagrou o início da mudança das regras do jogo, ao alterar a Constituição Federal, a qual jurou cumprir, criando  pela primeira vez, no Brasil, o vergonhoso instituto da reeleição, aprovado pelo Congresso de forma suspeita e vergonhosa. Isto foi o princípio de tudo.  Não custa recordar a consistente suspeita da compra de votos de parlamentares para aprovar tal absurdo, tantas vezes denunciada, nunca perpetrado na história do país. A seguir, a condução do jogo eleitoral, no qual até os candidatos adversários foram escolhidos a dedo, para perder, com a totalidade do apoio dos meios de comunicação, financiados pelo Sistema Financeiro Internacional e dos Institutos de Pesquisa, num conluio incestuoso. Até os demais candidatos foram , na sua maioria, lançados pelo sistema, para pulverizar o tempo arbitrado pela justiça eleitoral na TV, principalmente, objetivando não ameaçar a unção do escolhido. A própria apuração por meio eletrônico, ao invés de garantir a lisura do processo eleitoral, pelo contrário, foi motivo de justa preocupação por parte dos partidos autênticos de oposição, impossibilitados de fiscalizá-lo convenientemente. É uma "caixa preta", a qual nem o setor de informática do TSE pode abrir.

              De fato, o presidente FHC iniciou seu segundo mandato, obtido graças à ilusão da estabilidade monetária, conquistada à custa da sobrevalorização cambial, em especial, com graves prejuízos à economia do país, sendo obrigado a desvalorizar o real, medida adotada tardiamente devido ao oportunismo eleitoral. Tal fato ajudou a esclarecer a verdadeira situação vivenciada pela nação. A realidade  do brutal desemprego, da destruição dos pilares do Estado Nacional Soberano, do sucateamento da estrutura produtiva do país, da desnacionalização da economia, do aniquilamento da infra-estrutura econômico-social, do desmantelamento dos macrosetores, do abandono das Forças Armadas, do empobrecimento da população, da crescente miséria e fome, e , o pior, da falta de esperança no futuro.

              O total atrelamento da condução de nossa "política econômica" às normas ditadas pelos "donos do mundo" torna a nossa economia extremamente vulnerável a qualquer variação ocorrida no exterior. O ataque especulativo empreendido contra nossa economia, no início De 1999, foi apenas uma pálida amostra do que poderá ocorrer no futuro. A aparente normalidade existente agora está sendo obtida a um custo muito elevado. As altas taxas de juros e a isenção fiscal estão atraindo para o país o pior tipo de capital que há. Aquele que pode sair do Brasil em 48 horas, provocando efeitos desastrosos em todas as expressões do Poder Nacional.

              Na realidade, o governo FHC de fato já acabou. A rigor, não deveria sequer ter começado. O primeiro mandato foi desastroso.  Representou a dilapidação de um patrimônio nacional incomensurável, o qual o povo brasileiro levou séculos para construir. Vale do Rio Doce, Usiminas, Acesita, Telebrás, Embratel, todo o setor de comunicações, os transportes. Nada foi construído. Só existiu para garantir a reeleição. O segundo mandato expressa apenas a intenção de acabar a obra de destruição iniciada. Nada será construído, de positivo. A modesta taxa de crescimento do PIB em 2001 é prova disto. Agora, é entregar a PETROBRAS, o Banco do Brasil, a Caixa Econômica Federal, a energia, a água, enfim o que resta de empresas. E então tentarão entregar a Amazônia. Como não conseguiram no segundo mandato, vão tentar com o candidato da situação. O programa econômico do PFL, partido ao qual pertence a candidata Roseana Sarney, é explícito até demais. Não se pode enganar a todos todo o tempo. A verdade é gritante. A situação ficará cada vez mais insustentável e sem romper com o modelo em vigor é impossível uma solução. A sobrevida obtida apenas aumentará o tempo de agonia do atual sistema de poder. É uma questão de tempo.

Correio eletrônico: mcoimbra@antares.com.br

Sítio : www.brassilsoberano.com.br