LIMITE INSUPORTÁVEL
Artigo
publicado em 16.01.2003 no Monitor Mercantil.
Prof.
Marcos Coimbra
Professor
Titular de Economia junto à Universidade Candido Mendes, Professor na UERJ e
Conselheiro da ESG.
As notícias recentes não são propriamente
favoráveis à formação de uma perspectiva otimista para os trabalhadores. A
começar pelo anúncio de várias reformas, como a previdenciária, quando todas as
idéias apresentadas, até o momento, são de subtrair garantias e direitos duramente obtidos ao longo do tempo e não de
apresentar algo novo, que represente avanço em prol da classe trabalhadora.
Ninguém fala mais em limitar o pagamento dos juros extorsivos, em submeter a
dívida externa à uma competente auditoria, em apurar as denúncias de corrupção
no processo de privatização e outras.
O Mahatma Gandhi foi um dos principais líderes
mundiais, de todos os tempos. De estatura modesta, magro, desarmado,
movimentava milhões de indianos contra a opressão inglesa. Foi preso, sofreu
muito, mas acabou alcançando seu
objetivo principal: a independência da Índia. Um dos mais importantes instrumentos
utilizados por ele foi a desobediência civil na qual o povo indiano
desarmado (pelos antecessores do Viva
Rio) enfrentava a tirania dos poderosos, escudados em canhões, navios de
guerra, metralhadoras, enfim toda a parafernália bélica da qual o império
britânico era detentor.
Analisando a conjuntura brasileira,
verificamos, na administração passada,
o Poder Executivo, utilizando a mídia amestrada, docemente corrompida,
com "musos e musas" do entreguismo, com o poder de censurar e vetar
até qualquer referência a quem desagrade aos "donos do mundo", seus
patrões, fazendo o que queria. E ainda possuíam a desfaçatez de pregar, contra a censura, em favor da liberdade de
expressão, quando eram os primeiros a exercer seu arbítrio, censurando os que
pensavam diferentemente. O Poder Legislativo, inteiramente submisso, mendigando
cargos e verbas, com honrosas exceções. Até o Poder Judiciário,
considerado como última esperança,
dobrava-se. A administração FHC, grande e verdadeira responsável pela grave
crise sistêmica enfrentada pela Nação, da qual a insuficiente oferta de energia
é um mero exemplo, tinha poderes ditatoriais.
Fala-se, novamente, na possibilidade do envio ao
Congresso pela atual administração, da proposta de uma reforma tributária. No passado recente, seu
principal objetivo foi a prorrogação da
cobrança da CPMF por mais 30 meses, em
um país como o nosso, aonde a carga tributária chega a 34% do Produto Interno
Bruto (PIB), sem a contrapartida adequada, sob a forma de prestação de serviços
de atendimento às necessidades coletivas (saúde, educação, segurança, energia,
transportes, comunicações e outras). A
atual administração, apesar dos discursos anteriores, pensa, dentre outras
barbaridades, em transformar a contribuição provisória (CPMF) em permanente.
Fica a idéia de que a única solução é a desobediência civil. Estamos atingindo
o limite do suportável.
Afinal, até hoje, nenhuma instituição de proteção ao
consumidor, nem qualquer partido político
questionou a cobrança da famigerada contribuição provisória sobre
movimentação financeira sobre os salários e proventos dos trabalhadores. Ora,
quem detém o controle do fator de produção trabalho recebe em contrapartida sua
remuneração, ou seja, salários. E estes poderiam ser pagos, como antigamente,
na boca do caixa, ou como é feito ainda hoje pelo SENAC-Rio, para quem quiser,
em espécie, através de envelopes com o
numerário no interior. Só recebe no banco, quem assim o desejar.
Deste modo,
eliminar-se-ia a cobrança da CPMF incidente sobre os salários. Atualmente, as
empresas, além de não oferecer opção aos seus empregados, pois impõem aos
mesmos a abertura de uma conta no banco de sua conveniência, usufruem de
vantagens concedidas em função deste movimento, enquanto os bancos ainda cobram
do assalariado diversas tarifas, sob vários pretextos, além da CPMF. O
principal argumento dos defensores da manutenção desta contribuição reside
justamente no fato de que ela não pode ser sonegada, possibilitando a
descoberta de agentes econômicos que fraudam o recolhimento de tributos,
através do cruzamento de informações. Ora, isto não é válido para o
assalariado, que assim poderia ficar isento de mais uma contribuição, além de
livre da extorsão dos bancos.
Por que os sindicatos, as centrais de trabalhadores
não agem neste sentido? Será que a maioria dos integrantes do Supremo Tribunal
Federal também vai obrigar os cidadãos a terem conta nos bancos, uma para cada
fonte empregatícia, escolhida pelos patrões, em função de seus interesses? E
quem garante que o recolhimento da CPMF é feito com a correção devida? Por
acaso alguma instituição fiscaliza o processo? Ou, falando em português claro,
será que o que é debitado em nossa conta é rigorosamente e imediatamente
depositado nos cofres do Tesouro? E este, faz o que com os recursos? Lembram-se
de que, no início da cobrança, o governo relutava em fornecer os dados
relativos aos valores arrecadados? Agora, estima-se que seja do montante de R$
18 bilhões anuais.
Fica a sugestão para os políticos de
oposição e para as centrais sindicais que, ao invés de defenderem os
verdadeiros interesses dos trabalhadores, costumavam entrar em conchavos
vergonhosos como, por exemplo, na administração FHC, o "acordo do
FGTS". Lutem, enquanto é tempo, por bandeiras justas como esta. Se não
lutarem, estarão jogando o povo no caminho da desobediência civil, praticada
atualmente por milhões de pessoas, que não pagam conta de luz e estão ignorando
o Estado e as empresas distribuidoras de energia, pois possuem "gatos"
(ligações clandestinas). A autoridade governamental que quiser verificar é só
conferir, por exemplo, no Rio de Janeiro, as favelas, fartamente iluminadas, e
comparar com a arrecadação feita pela Light, no referidos locais. Ou então observar os milhares de ambulantes
que vendem de tudo, sem pagar qualquer tributo, impedindo o livre trânsito das
pessoas, em frente dos comerciantes legalmente estabelecidos, em qualquer
cidade grande. Ou nas centenas de "vans" que praticam irregularmente
o transporte coletivo, estacionando em local proibido, engarrafando o já
caótico trânsito das grandes cidades.
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