ELEIÇÕES
DE FICÇÃO
Prof. Marcos Coimbra
Membro efetivo do Conselho Diretor do
CEBRES, Professor aposentado de Economia na UERJ e Conselheiro da ESG.
Artigo publicado em 01/08/08 no Vila em Foco
Começou
no mês de agosto o chamado horário gratuito eleitoral com a apresentação dos
candidatos às eleições de outubro. Listamos a seguir algumas
considerações sobre o processo ilusório de concretização de uma das maiores
democracias do mundo, assim denominada em função principalmente do
número de eleitores habilitados, superior a 120 milhões. De início, para um
cidadão ser empossado em um cargo público, através de concurso, deve possuir
ficha limpa. Não é compreensível que a mesma pessoa possa ter suacandidatura aprovada, tendo sido ele condenado até em 2ª
instância.
A seguir, o horário não
é gratuito. Isto porque as emissoras de TV e rádio que retransmitem o programa
da Justiça Eleitoral são recompensadas, pois abatem dos impostos devidos o
valor de tabela que obteriam com a venda do tempo, de acordo com o mercado.
Também o maior custo dos candidatos é a produção dos referidos programas. Quem
possui mais recursos apresenta os melhores programas. Os outros mal conseguem
ir ao ar.
Além disto, o horário
gratuito eleitoral também não é igualitário. O tempo é calculado em função da
bancada federal de cada partido. As alianças eleitorais, por “milhões” de
razões, proporcionam a alguns candidatos mais de seis minutos. A outros, cerca
de 50 segundos. Os debates são desprezados pelos candidatos que estão na
dianteira. São as regras do jogo impostas pelos oligarcas no poder. Em cada
estado, não é difícil prever o que vai acontecer. É a perpetuação no poder, que
se passa de pai para filho. Isto é democracia?
O voto é obrigatório,
quando nas verdadeiras democracias do mundo é facultativo. Demagogicamente,
permitiu-se o voto dos analfabetos e dos menores de 16 anos. Isto em um país
onde a maioridade penal só atinge aos maiores de 18 anos. Quando há um delito
eleitoral praticado por um eleitor menor de idade, na prática ele não é punido.
Candidatos inescrupulosos aproveitam-se disto em todas as eleições. Quanto ao
voto do analfabeto, além de constituir um desestímulo à alfabetização destas
pessoas, elas, de um modo geral, não possuem a possibilidade de acesso à
quantidade e qualidade de informações capazes de lhes propiciar melhores
condições de exercer o direito de eleger os mais capacitados. Do que adianta
possuir este quantitativo de eleitores, se em grande parte eles trocam seus
votos por benefícios diversos, tais como cestas básicas, dentaduras, óculos,
tijolos e outros?
Outro ponto a
considerar é o perigoso “voto eletrônico”, onde o resultado das eleições é
apurado em curto espaço de tempo, porém sem possibilidade de recontagem dos
votos, para comprovar sua validade. Apesar de todas as denúncias procedentes e
sérias formuladas, nada foi mudado. Somente a emissão do comprovante e a
apuração manual em, por exemplo, 5% das urnas,
aleatoriamente escolhidas, poderia assegurar a confiabilidade do processo. O
sistema não é confiável e coloca em dúvida a lisura dos pleitos no Brasil.
Inclusive, recente pesquisa da Associação dos Magistrados do Brasil (AMB)
apresentou um resultado preocupante. Mais da metade dos pesquisados não confia
no sistema. A interpretação divulgada foi a de que o resultado ilustraria a
percepção do povo, quanto ao abuso do poder econômico, influência dos
governantes etc. Tudo isto é fato. Porém, qual a verdadeira razão de não
realizar a apuração manual de parte dos votos colhidos? A justificativa
apresentada é a segurança. Mas os votos poderiam ser depositados em uma urna e
apurados pela Justiça Eleitoral.
As empreiteiras e
fornecedoras dos órgãos públicos são pródigas em concessão de
doações aos candidatos dos atuais governantes, interessadas em ganhar
licitações e concorrências milionárias, hoje e na expectativa do amanhã. São
ainda milhares de cargos em confiança. Os comissionados sabem que perderão seus
empregos, caso não apóiem as postulações dos atuais detentores do poder
político a permanecerem no cargo. E a legislação eleitoral é tão rígida que
obriga qualquer servidor público a afastar-se do cargo, noventa dias antes do
pleito, para evitar a possibilidade de utilização da função para influenciar
eleitores. Agora, com a aprovação da emenda constitucional que permite a recandidatura, o presidente da República, os governadores e
os prefeitos podem permanecer em seus cargos. O limite que separa a atuação
lícita do governante e sua ação como candidato é tênue. E a Justiça Eleitoral
fica em dúvida, pois ela aplica a legislação formulada pelo Congresso que é, propositadamente,
omissa. Na dúvida, quase tudo é permitido.
A
atuação da mídia, de um modo geral, também é altamente preconceituosa. Há
ligações incestuosas entre proprietários de veículos de comunicação, bem como
de editores, jornalistas e vários candidatos, em especial aqueles que estão no
poder, com o privilégio de destinar verbas vultosas de publicidade, da ordem de
centenas de milhões de reais para quem desejar. Desta forma, basta acompanhar o
noticiário diário das revistas, jornais e TV, para verificar quem apóia quem.
Há candidatos que ocupam meia página, com direito a foto, todos os dias, com
destaque para os atuais prefeitos. Outros aparecem de vez em quando. Os demais
são candidatos secretos. Só aparecem quando é obrigatório ou para serem atacados.
Assim,
fecha-se o circuito. Os candidatos detentores de maiores recursos aparecem mais
nos meios de comunicação e na propaganda eleitoral. A seguir, os
institutos de pesquisa, realizando seu mister, apuram o óbvio, isto é
percentuais maiores para os "riquinhos" e menores para os demais, às
vezes nem citados, ou mencionados com percentuais ínfimos. Como a maioria das
pesquisas é paga justamente pelos que possuem recursos em abundância, as
diferenças são acentuadas. O povo, geralmente, não aprecia votar em candidato
que não tem condições de vencer, votando nos que estão na frente nas pesquisas,
fechando-se o círculo vicioso, não virtuoso.
É
vital a urgente reformulação de todo o processo, por quem de direito, com o
objetivo de melhorar a qualidade da democracia no Brasil.
Correio eletrônico: mcoimbra@antares.com.br
Sítio: www.brasilsoberano.com.br