BRINCANDO DE DEMOCRACIA

Artigo publicado em 06.2006 no Vila em Foco.

Prof. Marcos Coimbra

Membro do CEBRES (Centro Brasileiro de Estudos Estratégicos), Professor aposentado de Economia na UERJ e Conselheiro da ESG

        O país  está em ebulição com a eclosão da campanha eleitoral para presidente, governadores, deputados federais e estaduais. Está em plena vigência a possibilidade de recandidatura dos atuais detentores do poder federal e estadual, sabiamente alcunhada de reeleição, pelo povo, pois é muito difícil um político no exercício do cargo, sem necessidade de pedir licença ou desincompatibilizar-se, com pleno domínio da máquina administrativa, perder a eleição. Recursos financeiros, escassos para os outros candidatos, são abundantes para os que estão no poder. As empreiteiras e fornecedoras dos órgãos públicos  são pródigas em concessão de doações aos atuais governantes, interessadas em ganhar licitações e concorrências milionárias, hoje e na expectativa do amanhã. São ainda milhares de cargos em confiança, ao dispor dos detentores do poder político. Os comissionados sabem que perderão seus cargos, caso não apoiem a sua postulação a permanecer no cargo. E a legislação eleitoral é tão rígida que obriga qualquer servidor público a afastar-se do cargo, noventa dias antes do pleito, para evitar a possibilidade de utilização do cargo para influenciar eleitores. Agora, com a aprovação da emenda constitucional que permite a recandidatura, o presidente da República, os governadores e os prefeitos podem permanecer em seus cargos. E o limite que separa a atuação lícita do governante, por exemplo, e sua ação como candidato é tênue. E a justiça eleitoral fica em dúvida, pois ela aplica a lei formuladas pelo Congresso que é, propositadamente, omissa. Na dúvida, quase tudo é permitido.

        E a atuação da mídia também é altamente preconceituosa. Há ligações  incestuosas entre proprietários de veículos de comunicação, bem como de editores, jornalistas e vários candidatos, em especial aqueles que estão no poder, com o privilégio de destinar verbas vultosas de propaganda e publicidade, da ordem de centenas de milhões de reais para quem desejar. Desta forma, basta acompanhar o noticiário diário das revistas, jornais e TV, para verificar quem apoia quem. Há candidatos que ocupam meia página, com direito a foto, todos os dias, com destaque para os atuais prefeitos. Outros aparecem de vez em quando. Os demais são candidatos secretos. Só aparecem quando é obrigatório ou para serem atacados.

        Assim, fecha-se um círculo vicioso. Os candidatos detentores de maiores recursos aparecem mais nos meios de comunicação e na propaganda eleitoral.  A seguir, os institutos de pesquisa, realizando seu mister, apuram o óbvio, isto é percentuais maiores para os "riquinhos" e menores para os demais, as vezes nem citados, ou mencionados com percentuais ínfimos. Como a maioria das pesquisas é paga justamente pelos que possuem recursos em abundância, as diferenças são acentuadas. O povo, geralmente, não aprecia votar em candidato que não tem condições de vencer, votando nos que estão na frente nas pesquisas, fechando-se o círculo vicioso, não virtuoso.

        O horário gratuito eleitoral também não é igualitário. O tempo destinado aos candidatos a prefeito, por exemplo,  é calculado em função da bancada federal de cada partido, não no dia da promulgação do resultado, mas sim numa data aleatoriamente escolhida pelos políticos, de acordo com sua conveniência. E as alianças eleitorais, por milhões de razões, nem sempre as mais éticas, proporcionam a alguns candidatos  mais de sete minutos. A outros, pouco mais de 30 segundos, por dia de apresentação. Os debates são desprezados pelos candidatos que estão na dianteira, com medo de mostrar sua fragilidade e cair nas pesquisas. São as regras do jogo impostas pelos oligarcas no poder. Em cada lugar, não é difícil prever o que vai acontecer. É a perpetuação no poder, que se passa ao longo de gerações, de pai para filho. E chamam a isto de democracia! Como sair disto e conseguir obter uma verdadeira democracia? Surpresas e acidentes de percurso acontecem, mas constituem exceções.

Correio eletrônico: mcoimbra@antares.com.br

Site: www.brasilsoberano.com.br

Artigo elaborado em 04.06.2006 para o Vila em Foco.