BÔNUS E ÔNUS: RIO DE JANEIRO

Prof. Marcos Coimbra

Conselheiro-Diretor do CEBRES, Professor de Economia e Autor do livro Brasil Soberano.

(Artigo publicado em 15.04.10 no MM)

         Está virando hábito no Brasil, em especial no Rio de Janeiro, os governantes usufruírem dos bônus do exercício do poder, sem querer ter a responsabilidade de assumir os ônus do cargo para o qual foram eleitos.

         Com muito apetite, nomeiam milhares de correligionários para cargos em comissão, sem concurso é óbvio, viajam para lugares paradisíacos com tudo pago, em 1ª classe, possuem segurança reforçada, deslocam-se em helicópteros, contratam obras faraônicas, despendem verbas vultosas em propaganda, enfim são altamente competentes em gozar as benesses do poder. Como exemplo, somente em publicidade o prefeito Eduardo Paes deverá gastar este ano R$ 120 milhões e o governador Sérgio Cabral R$ 180 milhões. Somando-se os dois valores encontramos a estupenda soma de R$ 300 milhões, superior ao pedido inicial de Paes à União, no valor de R$ 270 milhões para atendimento emergencial às vítimas da tragédia que vitimou aos fluminenses, a partir do dia 5 do corrente.

         Por sinal, fomos, infelizmente, testemunhas pessoais dos trágicos acontecimentos. Chegamos de viagem no Aeroporto do Galeão justamente na noite deste dia. Na ida, ficamos mais de 90 min dentro do avião, aguardando autorização da torre para decolar. O comandante da aeronave afirmou ser problema de sequenciamento. Na volta, tivemos que sobrevoar a pista durante cerca de 40 min até conseguir aterrissar. Ao chegar, percebemos a intensidade da chuva. Compramos logo o tíquete de uma das empresas de táxi especial para garantia de um transporte rápido e seguro para casa.

Doce ilusão! Apanhamos o 3º lugar da fila, no momento em que chegava uma viatura que levou o primeiro passageiro. Pensamos, em termos otimistas, que logo estaríamos em casa.  Ocorre que o próximo táxi apenas chegou mais de duas horas depois. Ainda aguardamos mais uns dez minutos para entrarmos no nosso carro e trouxemos mais dois passageiros, no estilo transporte solidário, que iriam ficar próximos ao trajeto contratado por nós. Evidentemente, todos pagaram o valor de R$ 75,00 (fixado em tabela) ao motorista, que assim faturou mais de uma vez uma corrida única. Porém, reconhecemos que foi justa a recompensa, pois o profissional realizou um verdadeiro milagre em conseguir levar os passageiros aos seus respectivos destinos.

          De fato, foi necessária a realização de um verdadeiro 13º trabalho de Hércules para concretização do objetivo. Ficou evidente a falta de infra-estrutura do aeroporto para atender a uma situação adversa, bem como das condições das vias terrestres. E o tema constante na conversa na fila, durante o tempo de espera, foi justamente a inconsequência da pretensão das autoridades em sediar eventos importantes como as Olimpíadas e parte da Copa do Mundo, considerando-se a precariedade das condições existentes tanto no Estado como no município do Rio de Janeiro, sendo muito pouco provável a solução dos problemas no espaço de tempo disponível até a data dos eventos.

         Ocorre então uma sucessão de acontecimentos penosos. Pessoalmente, houve deslizamento de terra, com queda de árvores na encosta vizinha ao nosso prédio, com consequências preocupantes. Familiares nossos em condomínios de boa qualidade tiveram suas residências invadidas pelas águas podres de um riacho, contaminado por esgoto, com perdas consideráveis.

         E então, a sociedade brasileira é bombardeada por uma série de ocorrências trágicas. São as chamadas “tragédias anunciadas” como a do Morro do Bumba em Niterói. Como admitir que governantes eleitos já por diversas vezes, seja para cargos executivos, seja para funções legislativas, não só nada fazerem para tentar evitar as mortes de mais de dezenas de vítimas, como afirmarem que desconheciam o problema? A macabra contabilidade de mortes já ultrapassa a marca de 232 vítimas em todo o Estado. Os antecedentes são contundentes. Na passagem do ano de 2010, a tragédia de Angra dos Reis ainda choca os cidadãos brasileiros e as providências necessárias para minorar o sofrimento dos atingidos ainda não foram devidamente implementadas.

         Aliás, causa espécie o desprezo do presidente Lula pelas tragédias ocorridas no Brasil. Enquanto ele foi pessoalmente ao Haiti e ao Chile, dentre outros, não teve a mesma solidariedade para com nossos irmãos duramente atingidos recentemente em Santa Catarina no passado recente, bem como agora no nosso Estado. Talvez porque eles não possuam o direito de voto em foros internacionais, como a ONU e congêneres e o nosso “pequeno timoneiro” agora, esgotado o seu horizonte de curto prazo no Brasil, pretende alçar vôos mais altos, como por exemplo o lugar de Secretário-Geral da ONU, presidente do Banco Mundial ou algo semelhante, a altura da sua estatura de “líder” mundial inconteste, admirado e respeitado por todos os terráqueos.

         O fato é que atualmente no Brasil e com maior ênfase no Rio de Janeiro, o Estado não funciona em benefício do cidadão honesto, pagador de seus impostos e cumpridor de suas obrigações. Ele apenas funciona como “pai patrão”, eficiente e eficaz na cobrança daquilo que imagina ser obrigação do cidadão. Não há contrapartida na relação. O povo só tem deveres, não direitos.

Absurdos inomináveis estão sendo cometidos pelos “administradores públicos”, com base em desculpas esfarrapadas, sem haver o cumprimento de suas obrigações.

Correio eletrônico: mcoimbra@antares.com.br

Sítio; www.brasilsoberano.com.br