A VARIG, A
SELEÇÃO E O BRASIL
Artigo publicado em 27.07.2006 no Monitor Mercantil.
Prof. Marcos Coimbra
Membro do Centro Brasileiro de Estudos Estratégicos
(CEBRES), Conselheiro da ESG e Professor aposentado de Economia na UERJ.
A VARIG
não é apenas uma empresa privada nacional. De início, ela foi administrada por
uma Fundação, a Rubem Berta, que representava os funcionários da empresa.
Sempre fomos favoráveis ao neocapitalismo com a participação ativa dos
empregados no controle e na gestão das empresas onde trabalham. Isto
representaria o ideal de um capitalismo moderno, onde os trabalhadores
aumentariam seu poder, em detrimento da tirania de meia dúzia de empresários
obcecados pelo lucro fácil, estabelecendo um desejável meio termo, capaz de
equilibrar as relações capital/trabalho, procurando a
democratização da sociedade. Além disto, a empresa era sinônimo do Brasil no
exterior, obtendo um resultado prático em sua atuação, não só em relações
públicas, como também no apoio a brasileiros no estrangeiro, superior ao papel
desempenhado por muitas embaixadas e consulados brasileiros.
Contudo,
como no livro de Eric Blair, verdadeiro nome do
genial escritor George Orwell, os animais quando
chegam ao poder, transformam-se, surgindo os mais iguais e os menos iguais.
Durante décadas, a VARIG foi a maior empresa de navegação aérea do Brasil,
realizando um excelente trabalho, em especial na integração nacional e no
turismo internacional. Porém, sua gestão não foi das mais bem sucedidas. Houve
excessos em todos os campos, principalmente na tentativa de operar hotéis de alto
luxo. Centenas de políticos, artistas e “personalidades” amigas das eventuais
administrações recebiam passagens de cortesia, viajando pelo mundo
gratuitamente. Os empregados usufruíam de regalias, a
nosso ver, que todos os trabalhadores
deveriam ter como exemplo, porém sem o devido cálculo dos custos e das
respectivas fontes de receita. Contratos danosos foram concretizados. As
diversas administrações da empresa não foram devidamente competentes. Duramente
atingida pelos “planos econômicos”, a VARIG teve uma perda de mais de R$ 3 bilhões, já ganha nos tribunais e recebida pela
Transbrasil, mas não por ela, além do contencioso no plano estadual.
Tudo
isto é conhecido. Mas o inadmissível é verificar a “passividade” da atual
administração Lula no encaminhamento e na busca de uma solução para o problema
criado. Todos os dias a imprensa divulga o drama de centenas de pessoas
desesperadas. Existe um processo diário de destruição da VARIG. Ela é “vendida”
a um conglomerado dirigido por um estrangeiro, especialista em comprar empresas
em situação desesperadora, para ganhar dinheiro em negociações futuras. As
concorrentes deitam e rolam, aumentando os valores cobrados pelas passagens, direta ou indiretamente. Existe uma obrigação de R$
9 bilhões a ser encarada e milhares de trabalhadores
em vias de demissão. E ninguém faz nada para ajudar a VARIG. É inexplicável,
considerando o passado recente (PROER, AES e outras pérolas), onde os recursos
públicos foram utilizados para socorrer até empresas estrangeiras
e ricos capitalistas. No futuro, talvez saibamos quais as verdadeiras
razões de tudo isto. É só verificar quem lucra com a agonia da VARIG.
A seleção
da CBF é outro exemplo de anarquia. A responsabilidade maior é da superior
administração da Confederação, mais preocupada em fechar altos contratos de
publicidade do que em procurar formar uma equipe digna de representar o Brasil
em evento de tal importância. O erro começa pela falta de comando em seu mais
alto nível. E vai sendo reproduzido nas esferas seguintes. Uma comissão técnica
passiva, sem poder de mando, com membros de ilustre passado, que não souberam o
tempo de parar.
Para qualquer cidadão comum era óbvio que não
ia dar certo. Jogadores visivelmente fora de forma empenhados em quebrar
recordes, preocupados em aparecer individualmente para garantir melhores
contratos profissionais,
principalmente em publicidade. Divisões internas entre os mais sérios e os
irresponsáveis, mais preocupados em gozar a vida, naquele momento. Em nenhum
instante, a seleção demonstrou jogar coletivamente. Eram “divas” mostrando-se geniais, com as
exceções de Dida, Juan, Lúcio, Zé Roberto, Kaká e, quando jogaram, Fred e Juninho Pernambucano. Até o
antes austero técnico entrou na dança da publicidade. O acesso dos meios de
comunicação, em especial da principal rede do país, era escandaloso, não
permitindo aos jogadores a necessária concentração, nem privacidade. Faltou
tudo à seleção. Garra, raça, coragem , vibração,
espírito de equipe, liderança, desprendimento, humildade, categoria técnica,
estratégias, táticas. Nem treinos coletivos eram realizados. Como sempre,
interesses econômico-financeiros prevaleceram. Saudades da época do “Felipão”, cujo maior segredo era a capacidade de coibir os
abusos e exercer a sua liderança, estimulando os jogadores.
Os dois exemplos citados representam
fielmente o retrato do Brasil de hoje. Acéfalo, amoral e imoral, sem projeto,
sem liderança, sem utopias, sem vontade. Uma falsa democracia, onde das mais
altas esferas até as mais baixas, a corrupção impera, os desmandos se sucedem,
a impunidade prevalece. Leis feitas para permitir a liberdade aos criminosos,
desde os de colarinho banco aos parricidas. Onde há a ditadura do Executivo
sobre os demais poderes e a implantação do partido único, sob o olhar complacente
de uma Sociedade anestesiada pela falta de educação e pela desinformação.
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