A VARIG, A SELEÇÃO  E O BRASIL

Artigo publicado em setembro de 2006 no Vila em Foco.

Prof. Marcos Coimbra

Membro do Centro Brasileiro de Estudos Estratégicos (CEBRES), Conselheiro da ESG e Professor aposentado de Economia na UERJ.

         A VARIG não é apenas uma empresa privada nacional. De início, ela foi administrada por uma Fundação, a Rubem Berta, que representava os funcionários da empresa. Sempre fomos favoráveis ao neocapitalismo com a participação ativa dos empregados no controle e na gestão das empresas onde trabalham. Isto representaria o ideal de um capitalismo moderno, onde os trabalhadores aumentariam seu poder, em detrimento da tirania de meia dúzia de empresários obcecados pelo lucro fácil, estabelecendo um desejável meio termo, capaz de equilibrar as relações capital/trabalho, procurando a democratização da sociedade. Além disto, a empresa era sinônimo do Brasil no exterior, obtendo um resultado prático em sua atuação, não só em relações públicas, como também no apoio a brasileiros no estrangeiro, superior ao papel desempenhado por muitas embaixadas e consulados brasileiros.

         Contudo, como no livro de Eric Blair, verdadeiro nome do genial escritor George Orwell, os animais quando chegam ao poder, transformam-se, surgindo os mais iguais e os menos iguais. Durante décadas, a VARIG foi a maior empresa de navegação aérea do Brasil, realizando um excelente trabalho, em especial na integração nacional e no turismo internacional. Porém, sua gestão não foi das mais bem sucedidas. Houve excessos em todos os campos, principalmente na tentativa de operar hotéis de alto luxo. Centenas de políticos, artistas e “personalidades” amigas das eventuais administrações recebiam passagens de cortesia, viajando pelo mundo gratuitamente. Os empregados usufruíam de regalias, a nosso ver,  que todos os trabalhadores deveriam ter como exemplo, porém sem o devido cálculo dos custos e das respectivas fontes de receita. Contratos danosos foram concretizados. As diversas administrações da empresa não foram devidamente competentes. Duramente atingida pelos “planos econômicos”, a VARIG teve uma perda de mais de R$ 3 bilhões, já ganha nos tribunais e recebida pela Transbrasil, mas não por ela, além do contencioso no plano estadual.

         Tudo isto é conhecido. Mas o inadmissível é verificar a “passividade” da atual administração Lula no encaminhamento e na busca de uma solução para o problema criado. Todos os dias a imprensa divulga o drama de centenas de pessoas desesperadas. Existe um processo diário de destruição da VARIG. Ela é “vendida” a um conglomerado dirigido por um estrangeiro, especialista em comprar empresas em situação desesperadora, para ganhar dinheiro em negociações futuras. As concorrentes deitam e rolam, aumentando os valores cobrados pelas passagens, direta ou indiretamente. Existe uma obrigação de R$ 9 bilhões a ser encarada e milhares de trabalhadores em vias de demissão. E ninguém faz nada para ajudar a VARIG. É inexplicável, considerando o passado recente (PROER, AES e outras pérolas), onde os recursos públicos foram utilizados para socorrer até empresas estrangeiras e ricos capitalistas. No futuro, talvez saibamos quais as verdadeiras razões de tudo isto. É só verificar quem lucra com a agonia da VARIG.

         A seleção da CBF é outro exemplo de anarquia. A responsabilidade maior é da superior administração da Confederação, mais preocupada em fechar altos contratos de publicidade do que em procurar formar uma equipe digna de representar o Brasil em evento de tal importância. O erro começa pela falta de comando em seu mais alto nível. E vai sendo reproduzido nas esferas seguintes. Uma comissão técnica passiva, sem poder de mando, com membros de ilustre passado, que não souberam o tempo de parar.

 Para qualquer cidadão comum era óbvio que não ia dar certo. Jogadores visivelmente fora de forma empenhados em quebrar recordes, preocupados em aparecer individualmente para garantir melhores contratos  profissionais, principalmente em publicidade. Divisões internas entre os mais sérios e os irresponsáveis, mais preocupados em gozar a vida, naquele momento. Em nenhum instante, a seleção demonstrou jogar coletivamente. Eram  “divas” mostrando-se geniais, com as exceções de Dida, Juan, Lúcio, Zé Roberto, Kaká e, quando jogaram, Fred e Juninho Pernambucano. Até o antes austero técnico entrou na dança da publicidade. O acesso dos meios de comunicação, em especial da principal rede do país, era escandaloso, não permitindo aos jogadores a necessária concentração, nem privacidade. Faltou tudo à seleção. Garra, raça, coragem , vibração, espírito de equipe, liderança, desprendimento, humildade, categoria técnica, estratégias, táticas. Nem treinos coletivos eram realizados. Como sempre, interesses econômico-financeiros prevaleceram. Saudades da época do “Felipão”, cujo maior segredo era a capacidade de coibir os abusos e exercer a sua liderança, estimulando os jogadores.

Os dois exemplos citados representam fielmente o retrato do Brasil de hoje. Acéfalo, amoral e imoral, sem projeto, sem liderança, sem utopias, sem vontade. Uma falsa democracia, onde das mais altas esferas até as mais baixas, a corrupção impera, os desmandos se sucedem, a impunidade prevalece. Leis feitas para permitir a liberdade aos criminosos, desde os de colarinho banco aos parricidas. Onde há a ditadura do Executivo sobre os demais poderes e a implantação do partido único, sob o olhar complacente de uma Sociedade anestesiada pela falta de educação e pela desinformação.

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