A PRIVATIZAÇÃO E O INTERESSE NACIONAL 

Artigo publicado no dia 14.02.02 no Monitor Mercantil

Prof. Marcos Coimbra

Professor Titular de Economia na Universidade Candido Mendes, Professor na UERJ e Conselheiro da ESG

                   A ênfase da nossa abordagem   sobre o assunto situa-se justamente na questão do interesse nacional. Preliminarmente, cabe a pergunta: quem concedeu autorização  ao atual governo   para alienar o Patrimônio Nacional? Estas riquezas pertencem à Nação, ao povo e não a uma administração transitória, como o "governo" FHC. Para venda deste Patrimônio  é necessária a permissão formal do Congresso e a consulta aos eleitores, via plebiscito ou referendo. Afinal, ainda não foi elaborada Lei Complementar sobre o malfadado "Programa Nacional de Desestatização", não tendo sido assim devidamente aprovado pelo Congresso como deveria ter sido. As medidas que estão sendo implementadas foram, em sua grande maioria, via Medida Provisória. Tanto é que a "venda" da Vale do Rio Doce ainda está "sub judice", graças a liminar concedida pelo Ministro Néri da Silveira, do Supremo Tribunal Federal, a qual deveria ter tido seu mérito julgado pelo plenário. Não foi ainda, devido ao pedido de vista do processo feita pelo ex-ministro da Justiça, Sr. Nelson Jobim, atual ministro do STF, o qual deveria ter levantado sua suspeição, em virtude de ter sido um dos principais artífices do programa citado, tendo sido nomeado para o Supremo pelo atual presidente FHC. De fato, em momento algum de suas duas campanhas o presidente atual anunciou como plataforma de campanha que iria desnacionalizar   os principais setores da  economia brasileira. Ele mostrava os cinco dedos da mão, prometendo melhores condições de saúde, educação, segurança, emprego (trabalho) e agricultura. Infelizmente, todos os indicadores destes setores pioraram desde  sua primeira posse. 

                   As principais justificativas para a ação do atual governo para "entregar" o país são três: a) falta de recursos do setor público para realizar os investimentos necessários nos setores a serem privatizados; b) necessidade de recursos para diminuir a dívida interna; c) geração de recursos para investimentos no social. Ora, todas elas representam desculpas esfarrapadas, para justificar o cumprimento das ordens do Diálogo Interamericano e do Consenso de Washington aplicadas não só no Brasil, como em outros países com funestas conseqüências (Argentina, com desemprego maciço e deterioração violenta das condições de vida da população; México, com dois movimentos guerrilheiros em ataque frontal ao Exército regular e outros países). Será que não percebem que isto também acabará ocorrendo   no  Brasil (atenção para a atuação do MST). Na realidade,  basta aprovar uma Reforma Fiscal decente, para diminuir a sonegação em pelo menos 50%, diminuir alíquotas e aumentar a receita da União em cerca de R$ 150 bilhões ao ano. 

                   O setor energético, estranhamente avaliado inicialmente em US$ 100 bilhões e por alguns em US$ 60 bilhões, e agora , como sempre, brutalmente subavaliado, não pode ser privatizado, sem que seja transferido o monopólio de estatal em privado. Caso contrário, como envolve os setores de geração, transmissão e distribuição, exigindo vultosos investimentos, será "canibalizado", perdendo o efeito sinérgico e provocando graves conseqüências, inclusive com o risco de "apagões" permanentes, do que é exemplo este racionamento ridículo, comprometendo o esforço de desenvolvimento nacional, que ficará  a mercê dos interesses estrangeiros, pois a energia é o principal vetor do desenvolvimento.

A privatização do setor de comunicações está  aí demonstrando os sérios riscos para a segurança nacional e para a privacidade dos cidadãos, devido ao controle exercido via satélites, além da brutal elevação de preços dos serviços e a sua elitização.   Mesmo nos países mais desenvolvidos, o setor público não abre mão do controle de setores estratégicos. No Brasil, além da entrega da Vale, diagnosticamos a possibilidade de a PETROBRAS ser destroçada pelas grandes irmãs.  O Banco do Brasil está sendo destruído. A seguir,  a energia. Em seguida, a saúde, os transportes, a educação. Tudo desnacionalizado. E aí, sobrará o que para os nossos descendentes?  Qual será o trunfo do Brasil para o terceiro milênio?

                   E tudo isto será vendido uma única vez. E os recursos apurados não resolverão nem o problema   da dívida interna (mais de R$ 650 bilhões), nem os graves problemas sociais. Quando mais se vende, maior é a dívida. Como sempre os recursos serão desviados no caminho. Será que voltaremos a ser colônia, com a destruição do Estado Nacional Soberano , das Forças Armadas, a desintegração do território nacional, o esfacelamento do Patrimônio  Nacional e o surgimento de "exércitos particulares de mercenários", a exemplo da África, com o "esquartejamento" do país?

Agora, o insuspeito Tribunal de Contas da União,  em relatório do ministro Adylson Motta, afirma : " venda de estatais não aumentou investimentos no social", "as privatizações contribuíram para achatar a renda, fazendo com que a participação da massa salarial no PIB, que era de 45%, em 92, despencasse para 37%", "quem mais se beneficiou da guerra tarifária nas telecomunicações foram consumidores de renda  mais alta (os serviços utilizados por pequenos usuários terão descontos médios de 4,9% até 2005, enquanto o uso de rede da Internet e as chamadas internacionais ficarão 66% mais baratos)",  "o Tesouro Nacional gastou R$ 26 bilhões para recompor as tarifas elétricas antes do início das privatizações. Os investimentos em infra-estrutura foram insuficientes, resultando em uma grande defasagem entre a oferta de energia e o crescimento do consumo. Este cresceu em 114,5% em 15 anos, enquanto o crescimento da oferta ficou em 77%" e "o novo modelo de privatização do setor elétrico, baseado na participação do capital privado, mostrou-se ineficaz para evitar a grave crise de energia".

                   Aos poucos a verdade vai surgindo, só que agora é tarde para mudar. A única saída é impedir a venda de qualquer outra estatal e pressionar os candidatos à presidência para que incluam em seus respectivos planos de governo a auditoria e revisão das privatizações maléficas ao país e a seu povo.         

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