AGRURAS DO CONSUMIDOR

Artigo publicado em 01.08.2002 no Monitor Mercantil.

Prof. Marcos Coimbra

Professor Titular de Economia junto à Universidade Candido Mendes, Professor na UERJ e Conselheiro da ESG.

 

         No Rio de Janeiro, o consumidor possui pouco prestígio. Na moderna Economia, ele deve ser o centro de atenções do sistema, pois é o cliente. Entretanto, aqui, continua a ser desprezado pelas empresas. Principia pelos chamados serviços públicos, em especial, os administrados, oriundos de setores privatizados e sob controle de estrangeiros. A antiga CEG (gás), hoje pertencente a um grupo espanhol, insiste em mudar o abastecimento da cidade do Rio de Janeiro, de gás manufaturado para gás natural, sem consulta à população, sob o beneplácito da administração estadual. Todos sabem  que a alteração penaliza os consumidores. De início, as despesas passarão a ser bem maiores, aos mesmos níveis do consumo anterior. Toda a estrutura das residências está calcada no abastecimento com gás manufaturado e a mudança ocasiona vários problemas, provocando inclusive a substituição da canalização existente, com os custos transferidos para os consumidores. Isto, sem considerar os riscos de acidentes, incêndios etc. E, sabendo-se que parte do gás natural a ser consumido será importado, isto significará a “dolarização” das tarifas, com o conseqüente ônus para o consumidor.

         Na energia, a própria Associação das Distribuidoras de Energia (ABRADEE) confessa que as tarifas do setor subiram 40% acima da inflação, medida pelo IGP-M desde o início do plano real. Além disso, as empresas ainda empurraram para os consumidores a responsabilidade das conseqüências econômicas negativas provocadas pelo racionamento. Nas comunicações, o quadro não difere. Inexiste controle das ligações telefônicas, em especial do tempo de duração, e a inadimplência aumenta significativamente. Contas de mais de um ano são impostas. E os consumidores não têm meios para comprovar sua veracidade. E a controladora da Embratel, a MCI WorldCom, solicitou concordata, sendo acusada ainda de adulterar seu balanço. Caso não paguem,  os consumidores são punidos com a interrupção dos serviços e com a inclusão no SPC. No nosso Estado, apesar do abusivo valor do IPVA cobrado, as ruas e rodovias estão em condições cada vez piores. E os postos de pedágio proliferam, para alegria das empresas agraciadas e os políticos associados. Até na navegação aérea, o cartel que domina o setor aumenta seus preços em 20%, em pouco mais de um mês, e ainda exige um “PROER”. Os lucros são privados. O prejuízo socializ adequadamente ado. A administração FHC privatizou os setores, mas não elaborou previamente a regulamentação adequada, criando as agências reguladoras só para constar, fazendo a alegria das empresas e o desespero da população.

         No relacionamento com os bancos, financeiras, cartões de crédito e assemelhados, então os consumidores são massacrados. Primeiro, são obrigados a aceitar a chamada conta salário no banco imposto pelo empregador, onde são de tal forma envolvidos pelas empresas, que acabam pagando, com as tarifas, taxas e outros, todas as despesas de seu pessoal. E os seus lucros aumentam cada vez mais. O Banco Central, que deveria fiscalizar o sistema e proteger o consumidor, revela-se, na prática, o guardião dos banqueiros. Todos sabem que os juros cobrados são extorsivos e, recorrendo à Justiça, os consumidores farão valer seus direitos. Porém, a Justiça é extremamente morosa e a grande maioria dos cidadãos não tem possibilidade de acesso a ela. No final, quem especula ganha mais do que quem produz.

         No trato com os demais setores, o panorama não é animador. Também, de um modo geral, no varejo, as grandes organizações (supermercados) expulsaram as pequenas empresas do segmento (armazéns, quitandas), passando a controlar o mercado. Constituem quase um oligopólio e, como tal, manipulam os consumidores. Criam hábitos de consumo desnecessários, vendem rolo de papel higiênico de 40 metros com 30 metros, quilograma com 750 gramas e litro com meio litro, aos preços cheios, sem desconto. Possuem o mínimo de pessoal, alguns poucos atendentes, caixas e seguranças, colocando os consumidores a trabalhar para eles. Conseguiram até, ao arrepio da lei, impor o sistema de mercadorias marcadas com código de barras ao invés de propiciar transparência, informando claramente os preços. É comum na hora do caixa, os consumidores mais atentos descobrirem diferenças no valor cobrado, obviamente  contra eles. Nos “shopping centers” até  o estacionamento é pago.

         Na realidade, os consumidores são desrespeitados a todo o momento. O código de defesa do consumidor é um bom instrumento de defesa, mas ainda não foi convenientemente divulgado. Os órgãos de defesa do consumidor ainda existem em estado embrionário, sendo alguns até manejados indiretamente pelas empresas, que conseguem controlar seus dirigentes. Em pleno século XXI, os consumidores merecem ter seus direitos assegurados, devendo o setor público agir de modo a assegurá-los.

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