A FACE OCULTA DA REFORMA DA PREVIDÊNCIA
Prof. Marcos Coimbra
Professor Titular de Economia junto à Universidade Candido Mendes, Professor na UERJ e Conselheiro da ESG.
Correio eletrônico: mcoimbra@antares.com.br
Sítio: www.brasilsoberano.com.br
Artigo publicado em 01.2004 no jornal Ombro a Ombro.
Dentro das diretrizes impostas pelo FMI às diversas administrações brasileiras, em seus sucessivos acordos, figura a mudança profunda na previdência social adotada pelo Brasil. Na administração anterior, a reforma foi tentada, mas não concretizada totalmente, em função da reação adversa provocada na opinião pública. Só parte dela foi implementada, daí resultando o "pedágio", pago pelos pobres trabalhadores, em função da quebra das regras do jogo vigentes. Agora, a cruel medida voltou a ser apresentada ao Congresso, elaborada pela mesma equipe que tinha planejado a anterior, inclusive com integrantes pertencentes ao atual núcleo duro do Planalto, tendo sido aprovada, inclusive em seus aspectos mais nefastos. A verdadeira razão da necessidade de sua implementação reside apenas em proporcionar lucros vultosos aos fundos privados de pensões, principalmente estrangeiros, interessados em explorar mais o já sofrido povo brasileiro.
O segredo de tudo está na fixação do teto máximo de R$2.400,00, como limite superior de benefícios. Qualquer cidadão consciente sabe que esta renda é insuficiente para garantia de uma vida digna para si e sua família, na velhice, e assim será obrigado a recorrer a um fundo de previdência complementar. Para celetistas não há saída. Estão condenados a ingressar em um plano privado de previdência. Para os servidores públicos, duas opções. Ou participar de um fundo fechado, a exemplo da PREVI, ou também entrar em um fundo privado. A PREVI, apontada como modelo pelos defensores da radical mudança, padece de sérios problemas. Este ano mesmo, em junho, deixou de reajustar os seus benefícios de acordo com as cláusulas impostas por ela própria, anteriormente, aos seus associados, dando um "calote" de cerca de 12%, medida que está sendo questionada na Justiça. Além disto, alterou, arbitrariamente, o índice para os reajustes futuros, sem consulta ao corpo de associados. É chefiada por uma diretoria composta, metade por membros indicados pelo patrão, e a outra metade por associados eleitos. Por "coincidência", quase todos pertencentes à mesma facção do mesmo partido político. Quem a controla possui um poder incomensurável. Decidir quem será o vencedor dos leilões de privatizações, passando pela nomeação de uma centena de membros de conselhos de administração das empresas mais rentáveis do Brasil, todos remunerados regiamente, até influir na destinação de verbas para propaganda eleitoral das mesmas empresas nas eleições.
Imaginem nos demais fundos e nos que serão inflados ou criados pelas novas regras. A realidade é que a previdência não é deficitária, como a sórdida campanha desencadeada pela mídia amestrada procura demonstrar. Se não houvesse o desvio, para o pagamento de juros da dívida, da COFINS (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social), da CPMF e outras, ela já seria amplamente superavitária. É preciso não esquecer que, de um modo geral, o governo, em seus três níveis, não contribui com a contrapartida à contribuição dos seus servidores. É preciso indagar onde está o montante arrecadado ao longo dos últimos sessenta anos, a título de contribuição para a previdência social, dos trabalhadores brasileiros. O valor estava em torno de um trilhão de reais, atualizado, segundo cálculos conservadores. Que tal combater a sonegação, as isenções indevidas, o desperdício, a corrupção, aplicar adequadamente os valores arrecadados e o assistencialismo irresponsável, como o pagamento de benefícios sem contribuição?
Existem carreiras de Estado, como a Magistratura, o Ministério Público, a Diplomacia, a Carreira das Armas e outras que devem ser obrigatoriamente cobertas totalmente por ele, sob pena de seu desaparecimento progressivo. Resta o recurso à Justiça, pois a citada reforma fere cláusulas pétreas da Constituição.