A CONJUNTURA
NACIONAL E O AGRONEGÓCIO
Prof. Marcos Coimbra
Membro do Centro Brasileiro
de Estudos Estratégicos (CEBRES), Professor de Economia aposentado da UERJ e
Conselheiro da ESG.
Artigo publicado em 31/01/2007 e 30/02/2007 no Monitor
Mercantil
É indispensável
compreendermos o contexto internacional
em que estamos inseridos, para analisarmos a conjuntura nacional, seus aspectos
positivos e negativos, perspectivas, com ênfase no agronegócio.
A atual
situação internacional caracteriza-se pela formação dos megablocos
econômicos, do surgimento de uma potência hegemônica, os EUA, apesar de haver
uma multipolaridade econômica trilateral (EUA, Japão
e Alemanha), pela imposição das idéias do neoliberalismo e da globalização, a
qual nada mais
é do que uma forma de neocolonialismo moderno, pela
tentativa de domínio pelo G-7 (acrescido estrategicamente da Rússia) do Resto
do Mundo e pela criação do Diálogo Interamericano, instituído em 1982 por
iniciativa do banqueiro David Rockefeller e pelo
Consenso de Washington (1988), de onde surgiram as diretrizes impostas aos
países detentores de matérias primas nas Américas, denominados de extratores.
Não é por coincidência que, lendo-se a relação dos integrantes do Diálogo
(iad@thedialogue.org)
identificamos nomes de políticos, empresários e líderes famosos
que foram, são ou serão dirigentes máximos em seus respectivos países.
Também
os EUA exigem como condições essenciais para negociação com qualquer país:
estabilidade monetária, abertura às importações(livre
comércio), privatização e acordo de marcas e patentes (biogenética, inclusive),
com cláusula de retroatividade. Por “coincidência”, todas estas condições foram
cumpridas recentemente pelas diversas administrações brasileiras.
A
“política (?) econômica” da atual administração Lula, bem como a anterior,
caracterizou-se pelo
fiel cumprimento das instruções impostas pela banca internacional, por
intermédio do FMI. Se não, vejamos. A meta representada pela garantia da
estabilidade monetária, com a desculpa de obtenção de condições de
governabilidade, sem haver uma meta de crescimento. As variáveis instrumentais
usadas foram, principalmente:
1 - o arremedo de reforma tributária, limitada em sua
essência pela prorrogação da CPMF e da DRU (Desvinculação das Receitas da
União) em 20%, por mais 4 anos, pelo fortalecimento da
CIDE , pelo compartilhamento de alguns impostos regulatórios,
pela criação de mais tributos e contribuições, ocasionando o aumento da carga tributária para cerca de
40% do PIB;
2 – o arrocho salarial, com uma queda de mais de 50%
no poder aquisitivo da classe média, nos últimos 15 anos;
3 – a elevada taxa de juros, com a taxa real superior
a 9%.
Os
gastos públicos na agricultura (relação dispêndio na agricultura/dispêndio
total) diminuíram de
6,64% do PIB (período 1980/89), para 2,17% (período 1990/2001) até alcançar
cerca de 1% (período 2000/2001), enquanto os encargos especiais de
refinanciamento da dívida chegaram a 34,94% do total, segundo dados do
SENAR-RJ, em trabalho elaborado pelo Dr. Bento Gonçalves. Atualmente, estimamos
para 2006 uma queda para 0,7%. Também no âmbito estadual, considerando-se o
somatório dos Estados pesquisados, a relação caiu de 1,40% (1998) para 1,19%
(2002). Analisando-se o
Crédito Rural-Programação e aplicação de recursos nas safras
2005/2006 e 2006/2007, verificamos que, comparando-se a programação com a real
aplicação dos recursos, o desembolso relativo
oscila entre 0% e 15%, no primeiro período, e entre 5% e 14%, apenas, no
segundo período.
Nas
diretrizes fixadas, elas pregam que as medidas econômicas do Governo sejam
estabelecidas de acordo
com o FMI: superávit primário de 4,25% do PIB, elevada taxa de juros, proibição
de controle cambial e de moratória, abdicação da capacidade de elaboração de
uma política de comércio exterior autônoma, política monetária rígida e pela
implantação de reformas estruturais (previdenciária, trabalhista etc.).
Identificamos como resultantes: superávit comercial superior a US$ 44 bilhões,
superávit do balanço de pagamentos em transações correntes acima de US$ 4 bilhões, investimentos diretos baixando para cerca de 15
bilhões, taxa de inflação de 4,5%
(admitido o intervalo de 2%) ao ano.
Numa rápida análise da situação interna,
em outubro de 2006, temos uma dívida interna em torno de 50% do PIB; dívida
externa de
cerca de US$ 160 bilhões; déficit público nominal acima de 3% do PIB; pagamento
de juros de R$ 160 bilhões; reservas líquidas de US$ 74 bilhões: queda na
participação dos salários na renda nacional para 26% do PIB; estagnação da
atividade produtiva (previsão de crescimento em torno de 2,8 % na taxa de crescimento do PIB em 2006);
desnacionalização da economia e destruição do parque produtivo; agronegócio
severamente prejudicado pela adoção de juros elevados, real valorizado em
relação do dólar, financiamento difícil e dificuldades sérias na armazenagem e
distribuição.
A
relevância do agronegócio
pode ser demonstrada com os seguintes dados: responsável por cerca de 1/3 do
PIB, empregando 36% da mão-de-obra e por cerca de 40% das exportações. É o
setor mais importante da Economia pois seu conceito
abrange a atuação de toda a cadeia industrial (insumos agropecuários, produção,
agropecuária, processamento industrial e distribuição). A cadeia da indústria de alimentos deixa de ganhar de
R$ 5,5 a R$ 12,48 bilhões por ano, em virtude da ineficiência do sistema. Na
balança comercial, o agronegócio foi responsável por US$ 38,4 bilhões dos US$ 43,6 bilhões obtidos
em 2005 e por mais de 90% do saldo
comercial estimado para 2006.
Infelizmente,
identificamos também problemas graves nas demais expressões do poder nacional.
Na expressão política, flagramos uma reforma política
incipiente, uma reforma do Judiciário com a criação do Conselho Nacional de
Justiça, a tentativa de implantação da PPP(Parceira Público-Privada)
sem sucesso, a imposição de um ilegal e amoral estatuto do desarmamento e a
falta de um projeto para a Amazônia.
Principais conseqüências: Congresso submisso e Judiciário acuado, eleições
viciadas, corrupção desenfreada, aparelhamento do governo, a preparação, na
prática, para a implantação de um partido único, a perda da soberania nacional
e a destruição do Estado Nacional Soberano.
Na expressão psicossocial,
a reforma da previdência sem conter a evasão de recursos do setor, a imposição
do sistema de cotas na Universidade, a crescente privatização do ensino e a
consolidação do quarto poder(ditadura do cartel dos
meios de comunicação. Identificamos então a seguinte situação: desemprego
de 10% da população economicamente ativa (PEA), de acordo com o IBGE e
15,3% da PEA, segundo o DIEESE, em set/2006, além de
1,6 milhões de pessoas procurando, sem conseguir, emprego, em SP, de acordo com este último, no mesmo mês; deterioração e colapso nos sistemas públicos
de saúde, segurança e educação, com a alegação de falta de recursos, enquanto
são pagos cerca de R$ 160 bilhões de juros nos últimos doze meses; mais de 55% da população ocupada sem carteira
profissional assinada devidamente, 38 milhões com carteira assinada, 30 milhões
sem carteira assinada, 12 milhões de desempregados e 11 milhões de informais;
aumento desmesurado da inadimplência e meios de comunicação a serviço de
interesses vis.
Na expressão militar, a imposição da criação
do ministério da Defesa com a tentativa de transformação das Forças Armadas em
milícias de combate ao narcotráfico, com o afastamento progressivo dos
militares do centro de decisão e o desvirtuamento de suas funções. Como
conseqüências lógicas: queda nos percentuais orçamentários, afetando padrão de
vida, adestramento, aprestamento e investimento, campanha sórdida de contenção,
carência de líderes e falta de motivação e o progressivo sucateamento das
Forças Armadas.
Na expressão científico-tecnológica, a
inexistência de uma política eficaz (deterioração progressiva dos centros de
pesquisa, êxodo de cientistas, baixo número de registros de marcas e patentes),
ocasionando retrocesso na tecnologia autônoma, recursos insuficientes para
pesquisa, enfim, crescente dependência tecnológica.
No agronegócio, a insegurança jurídica
(invasão de terras, confisco de propriedade a pretexto da existência de
trabalho escravo e plantação de drogas ilícitas, por critérios arbitrários
fixados por burocratas ideológicos), a dificuldade de aplicação da legislação
trabalhista de curta duração, gerando um passivo trabalhista de R$ 34 bilhões
em 2007, bem como por só haver 1,5 milhões de trabalhadores com carteira
assinada, em um universo de 17 milhões trabalhando realmente, problemas de
crédito, logística, distribuição e com fornecedores, causando a diminuição da
área plantada, decréscimo na produção e progressivo ataque à propriedade
privada. De acordo com o o
Dr. Marcel Félix Caixeta, presidente da Comissão Nacional de Grãos, Fibras e
Oleaginosas da CNA e presidente da FAEG: “ A nossa grande praga é o governo”.
Apresentamos
como sugestões de políticas e estratégias a serem concretizadas:
A) Eleger como variável meta o pleno
emprego dos fatores de produção (trabalho), com digna remuneração.
Estratégias correlatas:
A1)
Estimular o agronegócio, eliminando a capacidade ociosa da economia e
procurando fortalecer o setor terciário: I)Criar incentivos para acoplar o
setor secundário, mais dinâmico, ao setor primário; II)Investir em Ciência e
Tecnologia, produtividade e qualidade: III) Aplicar recursos vultosos em
educação básica e no ensino profissionalizante;
A2)
Colocar o Brasil num patamar mais avançado de sua industrialização, com
relativo domínio das tecnologias de ponta, capacidade de exportação de
manufaturados, assegurada por sua inserção competitiva no mercado internacional
e garantia de atendimento, com produção nacional, da maior parte da demanda
interna, por manufaturas:
I)
Empreender
programas setoriais integrados prioritários não só no que concerne a segmentos
industriais, que permitem crescente domínio das tecnologias industriais
avançadas, como também os voltados para o consumo interno, em larga escala;
II)
Dar ênfase para
as indústrias extrativas minerais onde o país tenha vantagens comparativas ou
das quais depender a autonomia energética nacional;
A3) Priorizar as atividades dos setores secundário e
terciário capazes de criar emprego, com o retorno do BNDES às suas verdadeiras
funções: qualificação de mão-de-obra, turismo, construção civil, micro,
pequenas e médias empresas e outras;
A4) Diminuir expressivamente a taxa de juros,
colocando-a em níveis adequados à realidade internacional;
B) Recuperar a capacidade nacional de investimento, com rigorosa
seletividade da alocação dos recursos (acréscimo de 10% na formação bruta de
capital fixo), mais integração de propostas com a iniciativa privada e
reformulação de políticas sociais em vigor.
Estratégias correlatas:
B1)
Executar política fiscal capaz de propiciar ao setor público condições de
aumentar o nível de investimentos para retomada do desenvolvimento (7 % ao ano do PIB)
fazendo com que a receita tributária bruta seja no mínimo 30% do PIB,
diminuindo as alíquotas tributárias, combatendo a
sonegação fiscal (no mínimo, 100% da arrecadação), diminuindo o grau de
informalidade da economia (40% do PIB) e as despesas correntes do governo
reduzindo-se para 24% diminuindo subsídios, incentivos fiscais transferência de
recursos para Estados e Municípios e, principalmente, diminuindo o pagamento de
juros da dívida
B2)
Utilizar reservas financeiras das empresas (cerca de 4%
do PIB);
B3) Obter
o reingresso dos recursos adicionais emigrados para o exterior;
B4)
Manter poupanças externas de risco para empreendimentos específicos (reequipamento, reaparelhamento,
setores de ponta etc.) pelo menos em 1% do PIB;
C) Implementar uma Inserção
Soberana do Brasil na economia internacional (Política Cambial, de Comércio
Exterior e de Administração da Dívida Externa).
Estratégias correlatas:
C1) Assegurar a manutenção da taxa de câmbio em patamares
reais, supervisionando administrativamente
o orçamento cambial;
C2) Fixar o nível de proteção aduaneira à produção
interna sem prejuízo da política antiinflacionária;
C3) Adotar solução racional para renegociação da dívida
externa, com redução do seu montante (cerca de 50%), na realidade retirando
parcela substancial não utilizada efetivamente;
C4) Não renovar acordo vigente com o Fundo Monetário
Internacional (FMI), altamente lesivo aos interesses nacionais, procurando uma
saída que não ofenda a soberania nacional, sem também continuar a empregar, na
prática, suas diretrizes.
D) Valorizar o agronegócio.
Estratégias correlatas:
D1) Diminuir o custo do crédito e financiamento
agrícola;
D2) Garantir preços mínimos e melhorar as condições de
logística, armazenagem e distribuição da produção;
D3) Proteger a propriedade privada, em especial na área
produtiva do campo;
D4) Regularizar situação trabalhista no referente ao
trabalho de curta duração;
D5) Resolver problemas relativos às possibilidades de
confisco de terras (enquadramento arbitrário);
D6) Criar efetivamente seguro agrícola (hoje, 2%).
E) Restaurar a autoridade e a capacidade de iniciativa e de decisão da
gestão político-administrativa do Estado.
Estratégias correlatas:
E1) Adotar um novo pacto federativo,
propiciando maior integração entre União, Estados e Municípios.
E2) Implementar Reforma Política, objetivando aumentar a
representatividade dos eleitores:
I)
Alteração da Legislação
Eleitoral (horário gratuito, financiamento das campanhas,
emissão de comprovante de voto eletrônico, justiça eleitoral permanente;
II)
Transparência de
campanhas e de declaração de bens de todos os políticos;
III)
Proibição do
nepotismo e Lei de Inelegibilidades mais severa;
IV)
Proibição de
reeleição.
F) Restabelecer a autonomia do Judiciário e do Legislativo, recuperando
o sistema de contrapesos entre os três Poderes.
Estratégias correlatas:
F1) Escolha dos integrantes das Altas Cortes por mérito
e não por indicação política;
F2) Extinção da DRU e Emendas Orçamentárias distribuídas
honestamente.
G) Fortalecer a infra-estrutura social (educação, saúde e segurança).
Estratégias correlatas:
G1) Aumento da participação qualitativa do Setor Público
nos três segmentos;
G2) Estímulo à Iniciativa Privada nos setores de
educação e saúde, em caráter complementar;
G3) Desvinculação das Polícias Militares e Civis do
comando dos Estados, subordinando-as à Inspetoria-Geral das Polícias, no âmbito
da Força Terrestre.
H) Eliminar o cartel no setor de imprensa no país, através do incentivo
à regionalização e descentralização.
Estratégia Correlata:
H1) Rever as concessões existentes, alterando as regras
em vigor (estímulo à criação de redes regionais e proibição de redes com TVs,
rádios, jornais e revistas).
I)Restabelecer os ministérios Militares, com extinção do ministério da
Defesa e vinculação de verbas no Orçamento em percentuais do PIB.
J) Implantar um Projeto Nacional de Desenvolvimento
Científico-Tecnológico, com vinculação de verbas no Orçamento, em percentuais
do PIB.
L) Implementar um Projeto de Ocupação da
Amazônia, com políticas e estratégias vinculadas a prazos e recursos
orçamentários.
O Brasil tem todas as condições para
ser, em conjunto com a China, a Rússia e a Índia (BRICs) uma das
potências do terceiro milênio, pois possui
recursos naturais, dimensão e população. Para isto, entretanto, é vital:
imperiosa necessidade da inserção soberana do Brasil no mercado internacional;
elevação da auto-estima, da capacidade de crença no futuro do povo brasileiro;
alteração do modelo econômico para outro que tenha como variável-meta o pleno
emprego dos fatores de produção e sua digna remuneração; fortalecimento das micro, pequenas e médias empresas para aumento do
mercado interno, geração de mais empregos, revolução educacional para
transformação da mente de nosso povo; mais trabalho, mais honestidade,
civismo, patriotismo e capacidade de
realização.
Recordando
as palavras do nosso imortal Rui Barbosa: “ A Pátria
não é um sistema, nem uma seita, nem um monopólio, nem a forma de governo: é o
céu, o solo, o povo, a tradição, a consciência, o lar, o berço dos filhos e o
túmulo dos antepassados, a comunhão da lei, da língua e da liberdade.
Em toda a parte onde haja um prelo, uma tribuna, uma
praça há de ferver um coração patriota”.
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