A SAÚDE E O BRASIL

Prof. Marcos Coimbra

Conselheiro Diretor do CEBRES, Acadêmico Fundador da Academia Brasileira de Defesa, Professor de Economia e Autor do livro Brasil Soberano.

(Artigo publicado em 18.11.10 no MM).

            Após a análise, na semana passada, do vetor Educação, que, segundo a presidente eleita não será objeto de atenção especial, pois “está bem encaminhado”, passemos agora ao vetor Saúde.

Os países mais desenvolvidos, na década de 50, aplicavam em gastos com assistência à saúde cerca de 3% do PIB. Agora, alguns desses países têm 16 % de seu PIB investidos em assistência à saúde. E isto se considerando ter havido a progressiva desaceleração do crescimento populacional nesses mesmos países. Nosso sistema de saúde possui vários paradoxos. O primeiro, gerencial: improvisam-se gerentes para decidir em organizações complexas, do posto de saúde ao ministério da Saúde. O segundo, organizacional: descentralização centralizante, com o espectro do antigo INAMPS renascendo nas secretarias estaduais ou municipais de saúde. O terceiro, econômico: carência de recursos em paralelo a enormes desperdícios. Falta de pessoal, com profissionais desmotivados, descomprometidos. Falta de recursos materiais ou financeiros com desvios e desperdícios. O quarto, assistencial: resolutividade do ato médico entendido apenas nos estágios avançados de organização da saúde. Não existe promoção da saúde e a prevenção está reduzida à vacinação. O diagnóstico e tratamento constituem a verdadeira medicina, praticada nas enfermarias, nas UTIs e no Centro Cirúrgico. A reabilitação é desprezada. A prevenção então, nem se fala.

            Segundo a Profª Ligia Bahia (UFRJ), “em 2009 o total dos gastos públicos com saúde representou cerca de 4% do PIB e 12% da arrecadação tributária bruta. É muito pouco, sobretudo quando se considera que as despesas privadas com saúde, circunscritas aos segmentos populacionais de maior renda, superam as públicas.”

 A nossa Constituição prescreve que a saúde, ou melhor, a assistência médica, é dever do Estado e direito de todos, bem como a necessidade de um eficaz saneamento básico, pois é fato conhecido de todos que um real investido na prevenção poupa muitos reais consumidos na medicina curativa. E nosso diagnóstico, como economista, é assustador. O cidadão paga tributos a nível federal, estadual e municipal para que o Setor Público cumpra sua missão. E, infelizmente, constatamos reinar o caos na área. Há hospitais federais, estaduais e municipais com tarefas e regiões superpostas e a população cada vez mais abandonada.

            Recursos existem, se bem que insuficientes. Somente o ministério da Saúde tem um orçamento, no ano em curso, de cerca de R$ 62,09 bilhões. Porém, segundo o especialista Dr. Gilson Martins, “este valor precisaria de um incremento de pelo menos R$ 12,5 bilhões para assegurar o mínimo atendimento a todos os usuários do SUS. Para um atendimento ideal, o orçamento deveria receber outros R$ 100 bilhões.”

E não chegam ao destino final, sendo desviados para outras funções ou mal geridos, provocando desperdícios ou sendo desviados nas redes de corrupção. E a população, insegura, corre atrás de planos de medicina de grupo ou seguro-saúde, alguns se revelando verdadeiras "arapucas" e a maior parte apenas interessada em maximizar seus lucros. A maioria dos profissionais de saúde, na área pública, é mal remunerada, apesar de sua capacidade, enquanto uma minoria, composta de "marajás" do setor privado, enriquece numa associação espúria, canalizando pacientes para suas clínicas particulares, desde que os rendimentos sejam elevados e deixando o paciente de alto custo na rede pública, muitos dos quais associados destes famigerados planos, sem que haja ressarcimento ao Estado dos custos do tratamento.

            A solução passa pela clara delimitação de responsabilidades, com adequados orçamentos, pelas três esferas de poder. No plano federal, a responsabilidade pelo saneamento básico, pela prevenção das endemias, pela coordenação geral das atividades médicas empreendidas pelos estados e municípios. Na esfera estadual, o dever de manter hospitais de maior especificidade para atender aos problemas crônicos, de maior nível de especialização, demandando internações maiores. Aos municípios, além do reforço às funções anteriores, a responsabilidade pelo atendimento ambulatorial, a triagem, o restabelecimento do médico de família. Todos os profissionais bem remunerados, com treinamento adequado, recursos compatíveis, instalações dignas e o tratamento indicado assegurado (inclusive medicamentos e exames). Todo paciente com o direito de ser dignamente atendido, com o ressarcimento pelos planos particulares dos tratamentos efetuados, quando o paciente for associado a um deles. Assim, haverá recursos e todos serão atendidos pela rede pública dignamente. Quem tiver recursos de sobra, e assim o desejar, que procure os "medalhões". Na medicina verdadeira não há lugar para o mercantilismo. Quem o quiser, que deixe de exercer a nobre profissão e abra um cassino.

            Agora, percebe-se claramente o progressivo sucateamento da rede pública, o desprezo por seus profissionais, numa clara preparação da privatização total do setor. Os planos particulares já possuem mais de 52 milhões de associados, de acordo com dados de 2009. Faltam-lhes apenas os hospitais. E o planejamento dos "mercantilistas" da saúde é justamente este. Tornar os hospitais públicos inviáveis para comprá-los a preços vis, tornando-se assim possuidores deste vasto patrimônio, construído com recursos de toda a população que, como sempre, será esbulhada. Ou então, retirando os profissionais concursados e realizando contratos com “cooperativas”, procedimento típico no Rio de Janeiro. Não é por acaso que morrem, em média, 8 pacientes por dia por falta de CTI no Estado do Rio.

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